Sem meu corpo, o que resta de mim?

Sentada no chão

na pedra quente

sentada no corpo

corpo vivo

Vivo

Vi imagens de Alepo

ruínas sobre ruínas

ruínas sob ruínas

jazem jazigos mortos

mortos e mais mortos

corpos

nossa angústia posta a nu

“Uma palavra, se não é absorvida sem resto num sentido, resta essencialmente estendida entre as outras palavras, tendendo a tocar-lhes, sem no entanto se juntar a elas: e isto é a linguagem enquanto corpo.

Resta

Entre

Corpo

“Escrever é o pensamento endereçado, enviado ao corpo – àquilo que o aparta, àquilo que o estranha.”

Se pela máquina

não sinto

Afeto

Abjeção

Paixão

É porque não é o

outro´

do meu corpo

outro corpo

em mim

Sem meu corpo, o que resta de mim?

Fiquei longo tempo pensando

no órgão coração

pensei

num corpo sem órgãos

Como é carregar o coração de um outro?

Bombeando sangue

alimentando a carne

Sopro

Pneuma

E o mormaço persiste na pedra

porque mormaço é

uma palavra linda e morna

muitos sons persistem sob o mormaço

sobre a pedra

meu corpo

Alepo

ruínas e feridas

mortos

corpos e pedras

destroçados anistóricos

corpos de

Alepo

E logo aqui na esquina

da minha servidão

a servidão voluntária

também

Mas não

refiro-me aos

corpos

de cachorros

filhotes ou não

deixados na esquina

da minha servidão

Meu homem me disse

pela manhã

que a Terra é

de chorar

se vista de

um satélite

Lançarão um com sete quilos

apenas com um balão

e células

Corpos celestes

Corpus porcus

na Terra

no corpo

dela

“Síria nenhuma iguala a Síria

Que guardas na tua mente régia.”

Ainda não sei o que resta sem corpo