metrópole me atropela
multidão e choque
nada de novo
unhas pretas
recebem-me
selvageria e medo
chagas trabalhadas
em dança sabores olhos
de espuma e gozo
é japão itatuapé
sé na boca do abate
metrô praças imagens
e encruzilhadas fêmeas
madalena mariana margarida
judiths se apressam na pisada firme
pressão de muitos afazeres para reivindicar
o simples deleite da vida líquida
galeria do rock
no centro formigão de vasta quente barriga
criaturas distribuem alhures
furos de eternidade
tem teatro todo tempo
ainda
e nos largos queimam-se bruxas
ainda
afobam-se outras criaturas
da desgraça desforra
do discurso de castração
lá e cá uns também se afogam
nas galerias submarinas
e nas superfícies
atravessam acidentes
rochas pontiagudas
esfolam-se nessas passagens
peles
as ilhas se afastam
todas deslizando num mesmo fundo mar
possibilidades abissais
hesitante eu
na travessia
em qual irei repousar
minha pergunta?
na calçada da bela cintra
esculpida uma bunda cinza
com um pedaço de escroto carvão
emoldurava
a lajota fezes nossos pés
que trotavam em busca de
um tempo recuperado
no décimo oitavo andar
cogumelos e uma fala
rosê quase
sanguínea
expele a bílis de
um tempo perdido
melancolia
pulsa tudo
e uma poeta
diz que
o corpo urge
ainda / estamos em alerta
na trincheira contra
o quê?
estamos em pesquisa
diremos no momento certo
o lugar onde chegamos
e talvez já seja então
passado
trafegamos em discursos
dispersos inexatos
há sinais de ameaça
em todo canto
desconfio de toda sombra
de incredulidade
virá sim esse tempo
de novo?
ainda?
o horror sempre aí esteve, ora direis
sem indicação de saída
apenas uma pergunta
agindo no negativo
ninguém vai indicar a saída?
meu corpo irmão burro não sabe
não consigo articular minha língua
negativo é o desejo
não é isso?
o lacan que disse
não sei se foi isso o que li que ele disse
negativo?
extrapola a falta
estupra a fala
porque nunca
esteve o desejo?
nem no outro?
narciso é isso?
gozo do caldo caótico
obtido das contaminações
de desejos não amortecidos
nunca
ainda?
tudo me confunde
porque uns preferem
príncipes e princesas
às bruxas
ainda
feiticeiras na guerrilha
revisitam clandestinas
nossas delícias fronteiriças e livres
por momentos apenas
dionísios continuam sangrando
do alto de um mundaréu de sacos de lixo
lima barreto lamureia o destino
tanta desdita
solitário ainda
o poeta no lixo
no palco
multidão às avessas
mas as lâmpadas
continuam acesas
no décimo oitavo andar
e há refletores
que projetam luz
sobre as covas
femininas vozes
me cantam do mar
e tudo pode não passar
de uma ilusão
fugidia
sugando
minha vontade
de poder
porque o luto em mim
é silêncio e boicote
…
o céu está todo azul
há mar em torno
e todos os outros líquidos
tentáculos de polvos libidinosos
luas aguadas em lagoas
na tela entre morro e cidade
alguém apesar da fome
diz que o carboidrato é o veneno da vez
e câncer é apenas falta de oxigênio nas células
regule seu ph
é simples
refugiados palestinos
servem homus e falafel
e na bexiga da calçada
um rizoma móvel
acolhe possíveis garoas
fadas coroas que fingem
circunavegar
ruas tristezas
as armas em punhos
femininos ou masculinos
o (e) é grande motivo
de conflito
sem nenhum acréscimo
a humanidade quer
continuar destroçada
com falo em riste
mesmo assim
eu só queria dizer
bem no início
que alguma coisa aconteceu
no meu coração
quando cruzei a ipiranga
e a avenida são joão
e alguma coisa acontece agora
porque o sol
me agarra por trás
e minhas células
parecem celebrar
um coletivo de éguas
menos caos
nas águas intrauterinas
pausas ardores tumores amores
do meu ladinho
um beija-flor purpurina
fabula um voo cores
e beija brincos de princesas
que adoram seu beijo
e se deixam viver
apenas
nem se importam
ou sabem
do seu nome de princesa
ou de flor
brincos tampouco usam
habito entremundos
um pé em cada ilha
doloridos saltos altos
já sinto o esgaço
a fenda vai separar
meu corpo/ilhas
recomponho em seguida
os pedaços
misturam-se outros
mas nas suturas
ajustam-se as veias
depois é a bênção do iodo
baba de Iemanjá
ainda não sei em qual ilha
depositar meus destroços
entrecoletivos carrego-me
vacinas campanhas de afeto
sem garantias
e letras mínimas ilegíveis
indicam prazos de validade
que ignoramos