a partir da pergunta-convite de Iara, uma resposta com Felipe Tonon se desdobra:
a partir da pergunta-convite de Iara, uma resposta com Felipe Tonon se desdobra:
“só a desordem nos une: ceticamente, barbaramente, sexualmente” (Piva trollando Osvaldo)
maré
as imagens ardem
mais uma operação no complexo
encontro com objetos voadores não identificados
as imagens pedem
deslizamento de barreiras legais
as imagens fodem
transformação do vivo em podre
as imagens fedem
execução da progressiva ordem
as imagens podem
check-point
aqui
ali
é
n’ação
que separa
sequestro relâmpago
tomar o poder
em duas goladas
transplante
se descolar da imagem total
se abrir um corte preciso
se operar fora-de-si
se perguntar se
na ruína do corpo
é possível operar a arte sem litros de sangue?
Augusto de Campos, “CAVE MIDiA$.”In: http://bahia.ba/entretenimento/veja-dois-poemas-ineditos-de-augusto-de-campos/
CAVE CANEM SUM
latido ladino
cachorrada
roubo do osso do mundo
significantes
me alio
com obediência canina
com força animal
ladrando a busca de um lugar no desejo
do outro cão
que eu chamo babando
Sentada no chão
na pedra quente
sentada no corpo
corpo vivo
Vivo
Vi imagens de Alepo
ruínas sobre ruínas
ruínas sob ruínas
jazem jazigos mortos
mortos e mais mortos
corpos
nossa angústia posta a nu
“Uma palavra, se não é absorvida sem resto num sentido, resta essencialmente estendida entre as outras palavras, tendendo a tocar-lhes, sem no entanto se juntar a elas: e isto é a linguagem enquanto corpo.”
Resta
Entre
Corpo
“Escrever é o pensamento endereçado, enviado ao corpo – àquilo que o aparta, àquilo que o estranha.”
Se pela máquina
não sinto
Afeto
Abjeção
Paixão
É porque não é o
outro´
do meu corpo
outro corpo
em mim
Sem meu corpo, o que resta de mim?
Fiquei longo tempo pensando
no órgão coração
pensei
num corpo sem órgãos
Como é carregar o coração de um outro?
Bombeando sangue
alimentando a carne
Sopro
Pneuma
E o mormaço persiste na pedra
porque mormaço é
uma palavra linda e morna
muitos sons persistem sob o mormaço
sobre a pedra
meu corpo
Alepo
ruínas e feridas
mortos
corpos e pedras
destroçados anistóricos
corpos de
Alepo
E logo aqui na esquina
da minha servidão
a servidão voluntária
também
Mas não
refiro-me aos
corpos
de cachorros
filhotes ou não
deixados na esquina
da minha servidão
Meu homem me disse
pela manhã
que a Terra é
de chorar
se vista de
um satélite
Lançarão um com sete quilos
apenas com um balão
e células
Corpos celestes
Corpus porcus
na Terra
no corpo
dela
“Síria nenhuma iguala a Síria
Que guardas na tua mente régia.”
Ainda não sei o que resta sem corpo
Para Caio F.
Hoje resolvi escrever sobre o dia em que te conheci. Ainda me lembro da tua mão pouco firme pegando na caneta que rabiscava teus livros de pessoas desconhecidas. Era dia de educação física na escola e fazia muito calor. Lembro de suar e de ver suor na tua testa. Eu devia ter onze ou doze anos. Conhecia muito pouco de poesia e menos ainda de putaria. Falo delas porque hoje sei que em tudo te representam, mas naquele dia não foi assim. O que bateu foi o desconhecido. Meu pai me buscou na escola e me levou pra tua última sessão de autógrafos. Ninguém sabia que seria a última, mas talvez tu soubesse. Lembro de ver um machucado na tua cabeça e perguntar pro meu pai o que era. Não lembro da resposta, mas conhecendo meu pai, acho que ele me contou tudo sobre ti naquele mesmo instante. Lembro que tu não sorriu pra mim, mas me olhou com inocência e eu te olhei com curiosidade. Alguns meses depois, tu partiu. Meu pai chorou nesse dia, eu não entendi bem por que, mas deu vontade de te conhecer melhor. Te li por inteiro alguns anos depois. Te desejei em Morangos mofados, mas só me apaixonei de verdade em Os Dragões não conhecem o paraíso. Quis te abraçar em O ovo apunhalado e chorei gotas de chumbo com tua biografia. Ainda te sinto por perto toda vez que escrevo sem pudor.