Tenho o sobrenome de uma mãe

uma mãe estrangeira

que não me gestou

esse nome se sobrepõe à palavra

que me foi dada de presente como nome

por outra mãe

que tampouco me carregou em seu ventre

esse sobrenome ilha

invadida como todas as mulheres

Ilhas

motivos da guerra dos homens

que nos invadiram sempre

Nesse sobrenome há severidades

que nós, mulheres

guardamos no silêncio

Escolhi esse sobrenome porque é de uma mulher

Longínqua e só, como eu

mas que jamais perdeu

a fortaleza

Muralha que guarda tanta desventura

esse sobrenome me guarda e ainda

em ruínas permanece

Tenho o sobrenome de uma mulher

palavra fêmea

uivo da América Latina que também é mulher

e nós, ilhas e continentes seguimos movendo o mundo dos homens

mas eles sabem da voz

a nossa voz, as ondas e as tempestades cantam na mesma língua e têm a mesma força

Não deixarei descendentes para levarem consigo o sobrenome da mãe

deixo palavras ilhas femininas

marcadas nas páginas onde

sempre escrevemos

na terra arada onde sigo plantando

palavras árvores

palavras sementes

Se a montanha me foi tirada

se a plantação de sonhos me foi ceifada

busco a planície e a sombra da conífera mais alta onde semear sonhos novos

É na severidade da ilha onde nascem as mais belas e menos amargas.

Lua cheia de Setembro

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